Apagão inédito: calma, jeitinho, rádios e velas

Eram 11h33 da manhã de ontem quando em Rio Maior, e no resto do País, a eletricidade falhou.

Primeiro a internet começou a ter falhas, depois tudo ficou às escuras, em “black out”, no termo técnico.

“Uma vibração atmosférica induzida”, no interior de Espanha, que provocou uma “oscilação sucessiva de tensão”, o que obrigou a desligar subestações elétricas, é a versão oficial adiantada como uma possível causa, ainda sujeita a averiguações.

 

Quedas de aviões, ataque cibernético… não se confirmam

Qualquer coisa como o ar em torno dos cabos de alta tensão começar a vibrar, criando uma onda de pressão, acompanhada de um zumbido forte, levando o sistema elétrico a desligar-se.

Esta é assim a versão oficial adiantada pela REN – Redes Energéticas Nacionais, e pela sua congénere espanhola REE – Red Eletrica de España.

Não se confirmam quaisquer notícias de um avião que tenha caído sobre uma rede de alta tensão, ou um ataque cibernético, como chegou a circular nas redes sociais, alegadamente com fonte na CNN, que veio prontamente desmentir estas “fakenews” (notícias falsas).

A versão oficial adiantada é algo de que não há memória de alguma vez ter acontecido, segundo os especialistas da área, embora em teoria ela seja estudada, seja possível e haja protocolos para lidar com a situação.

 

Portugal estava a importar de Espanha cerca de 33% da sua eletricidade

Àquela hora da manhã Portugal importava de Espanha cerca de 33% da energia que estava a consumir, não porque não era capaz de a produzir, mas porque era mais barato importar eletricidade do que produzi-la cá.

De repente… 93% do País ficou às escuras. A rede espanhola desligou-se e a rede portuguesa, a jusante, foi imediatamente afetada e grande parte do sul da França, a montante, também.

 

     

Do black out ao arranque… 6 horas

E agora? É ativado o “Plano de Restabelecimento por Etapas”.

Isto quer dizer que a rede ficou em “black out” (totalmente apagada) e é preciso pôr centrais em Portugal a produzir eletricidade e ir “injetando devagarinho” até a rede estar em equilíbrio. O chamado “black start” (início a partir do escuro completo).

Nem todas as centrais produtoras de eletricidade conseguem fazer isto, é preciso terem sistemas preparados, porque normalmente para que uma central possa injetar eletricidade na rede, a “rede também tem de puxá-la”.

Se a rede estiver vazia, não tem como “puxar” ou provocar a entrada de nova eletricidade.

Cerca de 6 horas depois, por volta das 17h30, foi a barragem de Castelo de Bode, que se situa no rio Zêzere, entre os Concelhos de Tomar e Abrantes, e a Central Térmica da Tapada do Outeiro, em Gondomar, que funciona a gás natural, que “nos deram luz”. Pelas 18h00 estava a 50% da sua capacidade de produção.

Conseguem arrancar do zero, sem qualquer eletricidade na rede que vão abastecer e, por isso, são o sistema de retaguarda, o “back up” da rede nacional. Em 2026, outros centros produtores também vão estar equipados com o sistema “black start”.

É possível reduzir este tempo de arranque? É, mas o país teria de investir mais em sistemas de arranque do zero e estar preparado para mais custos de arranque nos centros produtores. Aí, as 6 horas que demorou, poderiam passar para apenas 2 horas, segundo os especialistas do setor e declarações da própria REN.

 

Muita calma e “jeitinho”

O processo é dificil porque quanto menos consumo houver, o “sistema” impede que haja mais produção, e se a rede estava a zero… não havia consumo nenhum.

Por outro lado, tem de haver um equilíbrio entre injeção na rede e consumo. À medida que começa “a entrar” a eletricidade na rede, ela também tem de começar “a sair”, e não pode ser de repente, porque a produção é lenta.

Sob pena de a rede voltar a desligar e regressarmos à estaca zero.

A reposição da rede elétrica é assim feita por fases, de região em região, como se fossem ilhas, ligando as subestações uma  por uma, das de maior potência para as de menor, até a rede geral se equilibrar totalmente.

E aqui, está também a subestação da Senhora da Luz, Rio Maior, uma das maiores do sistema.

Esta operação foi coordenada pelo Centro de Despacho da REN, localizado em Sacavém e onde a rede é gerida em tempo real, que esteve todo o dia em contacto permanente (linha aberta) com o Centro de Despacho Espanhol (da REE – Red Eletrica de España), que se situa em Alcobendas, Madrid.

Embora, no arranque da nossa rede, e no dia de ontem, não tenhamos tido qualquer ajuda do país vizinho. Ou, poderíamos voltar ao “apagão” de novo.

 

Comunicações sem 5G e prioritárias para segurança e socorro

Nas comunicações, o sistema 5G foi desligado, garantindo em primeiro lugar as comunicações das forças de segurança e socorro, e daí as dificuldades em efetuar chamadas e enviar/receber dados, mesmo com antenas a funcionar com gerador.

 

Nos Municípios, é a água que mais preocupa… e as velas

Nos Municípios, como Rio Maior, as principais preocupações passam pelo abastecimento de água.

As bombas de elevação no saneamento, por exemplo, também podem causar sérios problemas, mas a água é o mais crítico.

Com a falta de energia nas bombas de enchimento dos depósitos do sistema de distribuição de água, é preciso garantir que os depósitos “não secam”, e para tal, ou as bombas são alimentadas com gerador, ou é preciso transportar água e abastecer esses depósitos.

Por cá, não chegou a ser preciso acionar este plano.

 

Rádios a pilhas, velas, combustíveis, e papel higiénico… de novo

Em Rio Maior, na população, embora as grandes superfícies tivessem encerrado os seus estabelecimentos, outros comércios estiveram abertos e a corrida a velas, rádios a pilhas, enlatados… e também papel higiénico, de novo pós pandemia, foi notória.

Rapidamente a corrida aos postos de abastecimento de combustíveis, também se fez sentir, com filas enormes e até a necessidade de encerramento temporário de um deles para melhor regular o fluxo de trânsito.

No fim do dia, alguns estavam fora de serviço.

 

Não foi preciso fechar escolas

Já no funcionamento das Escolas, sem a previsão de eletricidade a curto-prazo, a ordem foi fechá-las no dia de hoje, o que não chegou a ser também necessário, uma vez reposta a energia logo na noite de ontem.

Hoje, pela manhã, cerca de 6 milhões e 400 mil consumidores da REN já estavam ligados, com exceção de cerca de 800 que tinham problemas técnicos, muitos dos quais já antes do “apagão”.

 

[Imagens: REN, RRM, EDP, google]

 

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