Santo António e Fernando Pessoa num só dia

E se hoje é dia de Santo António, assinalando os 793 anos da sua morte, próximo de Pádua (Itália), também é dia de Fernando Pessoa, mas aqui comemorando o seu nascimento, em 1888, há 136 anos. Ambos nasceram em Lisboa.

Naturalmente, este facto não passou despercebido ao Poeta, que lhe dedicou um poema, de que deixamos aqui a primeira estrofe:

Santo António, por Fernando Pessoa

Nasci exactamente no teu dia —

Treze de Junho, quente de alegria,

Citadino, bucólico e humano,

Onde até esses cravos de papel

Que têm uma bandeira em pé quebrado

Sabem rir…

Santo dia profano

Cuja luz sabe a mel

Sobre o chão de bom vinho derramado!

 

A vida de Santo António

Santo António de Lisboa, também conhecido como Santo António de Pádua, nasceu no dia 15 de agosto de 1195 em Lisboa, Portugal, com o nome de batismo Fernando de Bulhões e Taveira de Azevedo. Proveniente de uma família nobre, desde cedo demonstrou uma inclinação para a vida religiosa e para os estudos.

Primeiros Anos e Formação

Fernando iniciou a sua formação no Mosteiro de São Vicente de Fora, onde adquiriu uma sólida base em latim e ciências religiosas. Aos 15 anos, ingressou na Ordem de Santo Agostinho no Mosteiro de Santa Cruz em Coimbra, um importante centro de estudo e espiritualidade na época. Aí, passou cerca de dez anos aprofundando os seus conhecimentos teológicos e filosóficos.

Conversão e Vida Franciscana

Em 1220, inspirado pelo martírio de cinco frades franciscanos no Marrocos, Fernando decidiu mudar de ordem religiosa, adotando o nome de António em homenagem a Santo Antão do Deserto. A sua entrada na Ordem dos Franciscanos marcou o início de uma nova fase na sua vida, pautada pelo desejo de pregar e evangelizar.

Pregação e Fama

Santo António tornou-se conhecido pela sua eloquência e profundo conhecimento teológico. A sua capacidade de comunicação e o fervor das suas pregações atraíram multidões. Em 1221, encontrou-se com São Francisco de Assis, o que consolidou a sua posição na ordem. Enviado para o norte da Itália, estabeleceu-se em Pádua, onde a sua fama de pregador cresceu exponencialmente.

António dedicou-se à pregação itinerante e ao ensino, combatendo as heresias e promovendo a reforma moral e espiritual da sociedade. O seu estilo de pregação, simples, mas profundo, tornava os conceitos teológicos acessíveis ao povo. Consequentemente, isso lhe valeu o reconhecimento e a estima de muitos.

Milagres e Canonização

A ele são atribuídos inúmeros milagres, tanto em vida quanto após a sua morte. Entre os mais conhecidos, destaca-se o episódio do sermão aos peixes, em que, diante da indiferença dos homens, Santo António pregou para os peixes, que emergiram das águas em sinal de respeito. Outro famoso milagre é a aparição do Menino Jesus em seus braços, uma visão que teria sido testemunhada por várias pessoas.

Santo António faleceu em 13 de junho de 1231, com apenas 36 anos, em Arcella, nos arredores de Pádua. A sua popularidade e a multiplicidade de milagres atribuídos a ele levaram à sua canonização apenas um ano após a sua morte, em 30 de maio de 1232, pelo Papa Gregório IX.

 

E, a de Fernando Pessoa

Fernando Pessoa, nascido a 13 de junho de 1888 em Lisboa, é considerado um dos maiores poetas da literatura portuguesa e mundial. A sua obra vastíssima e multifactada revolucionou a poesia do século XX, introduzindo conceitos inovadores e explorando as profundezas da alma humana.

 

Pessoa é amplamente conhecido pela criação dos seus heterónimos — personalidades literárias distintas que escreveram com estilos e vozes próprias. Entre os mais famosos estão Alberto Caeiro, o mestre bucólico; Ricardo Reis, o classicista; e Álvaro de Campos, o modernista e futurista. Cada heterónimo possui uma biografia, uma personalidade e uma obra específica, demonstrando a capacidade única de Pessoa de habitar múltiplas identidades literárias.

 

A poesia de Fernando Pessoa é marcada por uma introspeção profunda e uma busca constante pelo sentido da existência. O seu trabalho reflete uma sensibilidade aguda para as contradições e complexidades da vida. O “Livro do Desassossego”, escrito pelo semi-heterónimo Bernardo Soares, é uma das suas obras mais introspetivas e reveladoras, oferecendo uma janela para o pensamento e a filosofia de Pessoa.

 

Além da sua obra poética, Fernando Pessoa também se destacou como ensaísta e tradutor, contribuindo significativamente para a cultura literária portuguesa. A sua influência estende-se além das fronteiras de Portugal, sendo reconhecido e estudado internacionalmente.

 

Fernando Pessoa faleceu a 30 de novembro de 1935, em Lisboa, deixando um legado literário que continua a inspirar gerações de leitores e escritores. A sua capacidade de explorar as múltiplas facetas da identidade humana e a sua inovação na forma e no conteúdo poético garantem-lhe um lugar eterno no panteão dos grandes poetas.

 

A celebração da obra de Fernando Pessoa é uma homenagem à riqueza e diversidade da literatura portuguesa, bem como um tributo à genialidade de um homem que viveu e escreveu como muitos, mas que será sempre único.

 

[Imagens: Wikipedia, CML]

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