50 Anos de Escuteiros. Entrevista ao Chefe do Agrupamento

O Agrupamento 403 do Corpo Nacional de Escutas, em Rio Maior, comemora neste mês de maio os seus 50 anos de existência e Região de Rio Maior entrevistou o seu Chefe. Fomos saber dos anseios e preocupações deste movimento.

Já a 16 de março se haviam assinalado os 50 anos das primeiras “Promessas” daqueles que haveriam de ser os primeiros Dirigentes deste Agrupamento.

Foi a 4 de maio, que na inauguração do seu Campo Escuta, cedido pelo Município, se celebrou a Missa Campal, foram agraciados antigos Dirigentes e “pessoas queridas ao Agrupamento, que muito contribuíram para que fosse possível”, como é o exemplo de Isilda Soveral, dando o auge a estas Comemorações.

     

D. Manuel Pelino, Bispo Emérito de Santarém, também ele um dia Escuteiro, presidiu a esta Missa e pôs tónica no caracter humanista do Escuteiro e do Movimento Escuta.

Nesta data simbólica, Região de Rio Maior (RRM) foi ao encontro de Pedro Santos, o Chefe de Agrupamento, e quisemos saber mais sobre este movimento, quem lhe dá corpo, o seu papel na Comunidade e os anseios e preocupações que os acompanham.

Pedro santos é o Chefe do Agrupamento 403, de Rio Maior

Pedro Santos, natural de Rio Maior, 39 anos, é Gestor de projetos de Tecnologias de Informação.

Cresceu em Rio Maior, saindo para Lisboa apenas aquando do ingresso no ensino superior e regressando uns anos mais tarde após uma passagem pelo estrangeiro. Vive há quase 10 anos em Rio Maior.

Durante o tempo que viveu fora, vinha constantemente a Rio Maior, principalmente pela família, mas também pela sua ligação aos escuteiros.

A sua vontade de pertencer aos escuteiros nasce por ter visto o Agrupamento na missa, o seu primeiro contacto, e pelo facto da mãe ser uma das jovens que integrou a geração de 1974, ano em que o 403 foi fundado.

Em 1994 ingressou nos escuteiros, com a minha irmã e uns anos mais tarde os seus pais entraram como Dirigentes.

Grande Entrevista

RRM: O que é um Agrupamento de Escuteiros? Como se organiza e funciona (de forma simples)?

Pedro Santos: O Agrupamento é o grupo local de Escuteiros pertencente ao Corpo Nacional de Escutas e tipicamente associado a uma paróquia. Um Agrupamento de Escuteiros é constituído por 4 secções e o quadro de Dirigentes, sendo as secções organizadas por faixas etárias de forma a poder acompanhar o crescimento das crianças e jovens, assim existem: os Lobitos dos 6 aos 10 anos, os Exploradores doas 10 aos 14 anos, os Pioneiros dos 14 aos 18 anos e os Caminheiros dos 18 aos 22 anos. Após os Caminheiros os jovens passam a integrar o quadro de Dirigentes do Agrupamento.

 

RRM: Quantos Escuteiros tem este Agrupamento e quantas pessoas envolve no seu todo?

Pedro Santos: O nosso Agrupamento conta neste momento com 102 pessoas, 80 crianças e jovens e 22 adultos, Dirigentes. Além dos Escuteiros o nosso Agrupamento conta com o envolvimento direto de cerca de 250 pessoas, entre famílias dos Escuteiros, Escuteiros que não se encontram no ativo e entidades que nos apoiam.

 

RRM: Tem mais, menos, Escuteiros que noutros momentos?

Pedro Santos: No passado já chegámos ter cerca de 130 Escuteiros no ativo, no entanto após pandemia chegámos a ser pouco mais de 90, com 102 Escuteiros neste momento abaixo da média tradicional do Agrupamento elementos antes da pandemia que rondava as 120 pessoas.

 

“Temos procura para entrada… quanto a Dirigentes a situação é diferente”

RRM: Todo o “movimento associativo” se queixa da falta de voluntários/aderentes e da dificuldade em manter atividades – até os Bombeiros, os Escuteiros também padecem deste “mal”?

Pedro Santos: O nosso Agrupamento vive duas realidades distintas no que toca a Escuteiros ou Dirigentes. Quanto a Escuteiros temos procura para entrada, maioritariamente nos Lobitos e Exploradores, assim tivéssemos capacidade para acolher todos os que nos procuram. Quanto a Dirigentes a situação é diferente, e é cada vez mais difícil encontrar que queira ingressar no Agrupamento.

 

RRM: Sentem dificuldade em atrair Dirigentes que possam manter esta estrutura a funcionar, formar, acompanhar, …?

Pedro Santos: Sim, existe dificuldade em atrair Dirigentes para manter o nosso Agrupamento, sendo a principal razão que nos vão apresentando, a falta de tempo. Também há quem nos diga que não se sente à vontade para tomar conta de outras crianças que não os seus filhos, e aparece ainda quem tenha receio de assumir o compromisso. Temos ainda a dificuldade em reter os nossos Caminheiros pois a maioria deles acaba por sair de Rio Maior, para estudar, e poucos são os que regressam, saindo por isso do Agrupamento.

 

RRM: Na sua opinião como poderia ser invertida esta tendência de menor adesão a este tipo de voluntariado?

Pedro Santos: Antes de dar a minha opinião sobre como poderia ser invertida esta situação, tenho de partilhar aquelas que acho serem as principais causas desta menor adesão, estas prendem-se com a falta de tempo mencionada anteriormente, o facto de atualmente a sociedade como um todo ser cada vez mais individualizada, num tempo altamente monetizado o Dirigente não ter qualquer ganho financeiro, e no caso em particular do nosso Agrupamento uma dificuldade muito grande de comunicação para fora. Para resolver esta situação são necessários alguns esforços tanto Agrupamento, como da sociedade. A nível de Agrupamento é necessário conseguir uma melhor comunicação, não apenas das atividades realizadas, mas também do porquê ser Escuteiro, em que é que o ser Escuteiro e em particular Dirigente nos torna melhor enquanto pessoa e profissional. A nível da sociedade penso que a questão do tempo poderia ser mitigada com incentivos não financeiros que compensassem algum do tempo que é ocupado com as atividades associativas, como por exemplo, dispensa do trabalho especificamente para este tipo de atividade.

 

“deixar o mundo um pouco melhor que o encontraram”

RRM: 50 anos depois Rio Maior, a Comunidade, é diferente porque houve Escuteiros?

Pedro Santos: Eu acredito que sim, temos ou tivemos Escuteiros espelhados por vários espaços de decisão, enquanto trabalhadores, empresários, políticos ou voluntários noutras associações. Acredito que as vivências escutistas marcam na sua relação com os outros e a preocupação com o “deixar o mundo um pouco melhor que o encontraram”. Acredito que as vivências em grupo nos ensinam a olhar o mundo para além do nosso indivíduo.

 

RRM: Como contribui um Escuteiro para uma Sociedade e uma Comunidade melhor?

Pedro Santos: O Escuteiro é alguém que é ensinado, desde muito cedo, a respeitar os outros. Primeiro em jogo nos Lobitos, em que aprendem que existem regras e que estas devem ser iguais para todos; depois evoluindo até ao serviço nos Caminheiros, que é o expoente máximo que o ser humano pode atingir para com a sua comunidade. O Escuteiro, durante o seu crescimento, adquire valores e competências únicas que constroem a sua personalidade e moldam a sua forma de ser. Mesmo sem se aperceberem, muita vez no seu dia a dia, as suas decisões e atitudes são balizadas por ensinamentos que adquiriu na sua vivência de Escuteiro, não se centrando apenas no que é melhor para si, mas incluindo o outro que está ao seu lado.

 

RRM: Neste mundo que atravessa alguma incerteza, “crise de valores”, talvez uma menor solidez de uma ideia de futuro nos jovens, falta de ambição e até de projeto de vida em alguns casos… um Escuteiro está melhor preparado para enfrentar esta realidade?

Pedro Santos: Sim, penso que sim. O escutismo procura transmitir um conjunto de valores e competências às suas crianças e jovens, com vista à sua formação integral. O percurso de crescimento de um Escuteiro assenta em 6 pilares essenciais, Físico, Afetivo, Caracter, Espiritual, Intelectual e Social. No desenvolvimento de cada um destes pilares, o Escuteiro vai adquirindo uma maior capacidade de adaptação às mudanças que vão ocorrendo ao longo da vida, é lhe dado espaço e são incentivados a refletir sobre várias temáticas, inclusive o que querem para o seu futuro. Chegando a Caminheiros e antes de fazerem a sua promessa o Escuteiro tem de escrever o seu Projeto Pessoal de Vida. Também durante processo de crescimento ocorrem falhas, erros, objetivos não cumpridos, nos Escuteiros é oferecido um espaço seguro para que tudo isto aconteça e se aprenda a lidar com estas situações.

 

RRM: Um Escuteiro é um “menino bem-comportado”, ponto?

Pedro Santos: Não, um Escuteiro é alguém igual a tantas outras crianças e jovens que gosta de brincar, jogar, divertir-se, que comete os seus erros e se pode portar mal como os outros, no entanto aprende desde cedo o que é errado, aprende e cresce com os seus erros e percebe que estes têm consequências.

 

Um novo espaço e “escrever os sonhos na nossa história”

RRM: Inauguraram agora o vosso Campo, isto contribui para melhorar a vossa atividade? Em que sentido?

Pedro Santos: O nosso Campo Escutista é na realidade um projeto com 12 anos, desde o dia em que o terreno nos foi cedido pela Câmara Municipal de Rio Maior temos vindo a utilizá-lo e a melhorar, a inauguração deu-se apenas nesta altura porque só agora o conseguimos ter listado como campo escutista. Fazendo por isso a retrospetiva destes 12 anos, sim, o campo permitiu melhorar a nossa atividade. Atualmente temos um espaço onde podemos realizar ateliers técnicos, onde temos madeira para treinar as construções, onde podemos acampar sem enfrentar as burocracias que alguns espaços criam, com condições de higiene que respeitam as exigências atuais, tudo isto com um custo baixo. Este campo permitiu que algumas das secções do nosso Agrupamento saíssem mais da sede e vivessem mais o escutismo na natureza.

 

RRM: Na inauguração disse que “os próximos 50 anos são páginas em branco por escrever”. O que querem escrever nessas páginas neste futuro próximo?

Pedro Santos: No fim-de-semana passado (10 a 12 de Maio) realizámos o nosso Acagrup, acampamento de Agrupamento, neste disse aos Escuteiros que todos eles são também parte da história do Agrupamento, são eles que neste momento irão escrever as próximas páginas, por isso queremos escrever os seus sonhos na nossa história, as grandes atividades em que participam mas também as pequenas, as novas experiências que vão vivendo, e as partilhas que fazem entre eles e com os outros Escuteiros com quem vão contactando. Posso, no entanto, partilhar alguns destes sonhos que fui ouvindo de alguns deles, participação nas atividades internacionais que se aproximam: Roverway 2024 na Noruega, o Moot 2025 em Portugal ou o próximo Jamboree Mundial em 2027, também alguns dos nossos sonham em ir a Kandersteg, campo mundial de Escuteiros localizado na Suíça. Enquanto chefe de Agrupamento, desejo também que estas páginas de história venham a incluir a nossa comunidade de Rio Maior, quer através de ações de serviço, ou com a interação de outras associações, uma continuada participação nas atividades da nossa paróquia, conto também que como hoje daqui a 50 anos possamos olhar para trás e ver que alguns Escuteiros do 403 serviram a nossa terra, tornando-se também eles parte da história de Rio Maior. Também como chefe de Agrupamento espero que alguns dos nossos Escuteiros não fiquem apenas por Rio Maior, espero que assumam e contribuíam também para o escutismo nos mais diversos níveis do CNE, ou fora deste, em outras associações que do seu serviço voluntário precisem. ♦

     

 

 

 

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