Ateliês, Declamações, Saraus, Recriações Históricas, Palestras, e muito mais…
São várias as formas que as Escolas do Concelho de Rio Maior escolheram para assinalar os 50 anos do 25 de Abril de 1974, sobretudo, para envolver os seus alunos neste contexto e permitir-lhes “absorver um pouco do espírito daquela época”.
Vários testemunhos de “personagens do 25 de abril”, Eduardo Agostinho contou a sua história
Era uma vez…
A Escola Secundária de Rio Maior (Escola Dr. Augusto César da Silva Ferreira) organizou, entre outras atividades, várias Palestras ao longo da semana para trazer o testemunho de presos políticos, outros na 1ª pessoa de quem teve um “papel” ou “episódio” no 25 de Abril, ou de qualquer forma se viram envolvidos naqueles acontecimentos.
Eduardo Agostinho, médico, em Rio Maior, Alferes naquele momento da História de Portugal, foi um deles, apresentado por Albino Frazão Correia, Diretor da Escola.
“Era uma vez…”, é assim que todas as histórias começam:
“De 3 em 3 meses havia exercícios de tiro real na Serra dos Candeeiros. Se saiam 20 munições do Paiol, gastavam-se 5 e o resto era guardado num paiol improvisado. Era preciso equipar os homens e os carros que iam sair para Lisboa…”
Este foi apenas um dos episódios relatados, quando Eduardo Agostinho era Oficial de Tiro e Armamento na Escola Prática de Cavalaria de Santarém nos tempos que antecederam a saída de Salgueiro Maia em direção à capital, e cabia-lhe a missão de gerir e justificar as munições que eram usadas… ou não.
Uma saída certa, só não se sabia quando e como
Ferveu-nos o sangue na guelra
Passou-se, a partir de determinado momento, a preparar meios humanos e materiais, nas suas palavras “homens e carros de combate, armas, e tudo naquilo que se aproveitava…” para aquela saída, ainda não se sabia quando e como, mas que começava a ser certa.
Foi Joaquim Correia Bernardo, Capitão à altura, hoje Coronel aposentado, que o “arregimentou”. A ele, e a um “Camarada” – designação dos militares entre si.
“Ferveu-nos o sangue na guelra, e aceitamos logo. Os jovens são generosos…”, palavras de Eduardo Agostinho, com a emoção da lembrança do momento.
E aqui, as coisas foram pensadas para o bem e para o mal. Se a “operação” fosse malsucedida, o “pacto de honra” estava feito e “ninguém se rendia”. No regresso a Santarém havia que fortificar as entradas da cidade e seria aqui que se defenderiam até ao fim.
“Aquartelavam-se e defendiam-se… porque o Regime era duro e iria reagir à ousadia…”
Da Escola Prática de Cavalaria de Santarém, ruma a Estremoz e forma Batalhão na “Cavalaria 3”, donde parte para o Ultramar, em África.
Ferido o Comandante da Companhia, assume interinamente essas funções e teve a seu lado, no mato, a verificar as operações, António Spínola. Ficou rendido, e assume-se como um “Spinolista”.
Mais tarde, já enquanto médico, ainda visitou o Marechal no hospital, dias antes de falecer (13 agosto 1996), ele que foi o Presidente da Junta de Salvação Nacional e Presidente da República, de maio a setembro de 1974.
A missão de saber quem estava alinhado
Eu não me meto nisso
O Capitão Correia Bernardo encomendara-lhe a missão de “sondar” quem estaria alinhado junto de outros Quartéis.
Num concurso militar anual de tiro, naquele ano em Marrazes, Eduardo Agostinho levou como missão saber como se posicionavam Caldas e Leiria.
Leiria disse logo que sim. Caldas respondeu “eu não me meto nisso”. E assim foi o resultado desta “exposição ao risco” de haver um que não alinhava, mas que ficou a saber o que se preparava…
Aos alunos presentes na sala, cheia, explicou ainda os “traumas de guerra” – stress pós-traumático que se trouxe de uma “guerra que dilacerou uma Nação e onde “o espírito de camaradagem entre estudantes das Escolas e Universidades portuguesas não foi explorado pelo então Regime”.
Os colegas de faculdade que tinham estudado em Portugal poderiam ter feito uma melhor descolonização
Havia inúmeros estudantes, de todos os cantos das então “Províncias Ultramarinas” que vinham ao Portugal Continental frequentar cursos e depois regressavam às sua origens.
Estes, na maioria dos casos, eram os ativos e líderes que personificavam os movimentos independentistas das então Colónias.
Mas, enquanto estudantes em Portugal, tinham desenvolvido laços de camaradagem estudantil com os que também cá eram dirigentes políticos. Não seria de usar essa ligação para se sentarem à mesa e entre “colegas” chegarem a um acordo que teria sido sempre melhor que a guerra, que foi um erro?
Foi uma das perguntas que Eduardo Agostinho deixou no ar e que tem “a convicção de que poderia ter resultado” melhor e que poderia ter trazido uma melhor descolonização, à semelhança do que outras potências já tinham feito.
O fulcro no “movimento dos Capitães”
O Estado a que isto chegou
Ainda tempo para expor, na sua opinião, o “fulcro dos acontecimentos” centrado no “movimento dos Capitães”, muitos já com experiência militar real, mais operacionais e pragmáticos, mas quase todos mais jovens, mais inter-relacionais com os Soldados a quem tratavam com dignidade e respeito, com uma “nova postura à Parada”, que mobilizava estes homens.
Mais tarde, desemboca num MFA – Movimento das Forças Armadas, para ser mais abrangente, mas que foi nos Capitães que nasceu.
Devido á falta de Oficiais naquele tempo, para comandar os homens na Guerra, o Governo de então resolve emanar um Decreto-Lei que permitia que militares já na reserva regressassem ao ativo e, após um curso de oficial intensivo – Capitão, saiam a comandar uma Companhia em África.
Ora isto, fazia com que ultrapassassem outros Oficiais que aguardavam há mais tempo na Academia Militar. O descontentamento grassou e “a revolta dos Capitães” começou a ganhar forma.
Uma das muitas coisas que terá contribuído para o “estado a que isto chegou”, atribuído a Salgueiro Maia, quando se dirigiu aos Militares na Parada.
“Matou alguém?”
Ainda militar cursou medicina em Coimbra, sendo que aos 24 anos de idade, Eduardo Agostinho já era Tenente, posto que deixou para se dedicar à vida civil, como médico.
Para além de outras funções sociais, Rio Maior conheceu-o pós aquele período como Comandante dos Bombeiros Voluntários, cargo que desempenhou durante 25 anos.
Deixou este seu testemunho na Escola Secundária de Rio Maior, neste dia 19.
“Matou alguém?”, a pergunta direta de uma das alunas presentes na sala.
Eduardo Agostinho, foi perentório: “Não”.